para a reposição de freguesias
Devolver às populações<br>o que é seu e lhes faz falta
O PCP entregou no Parlamento um projecto de lei com vista à reposição de freguesias extintas pelo anterior governo PSD/CDS.
A reorganização deve respeitar a realidade territorial e a vontade das populações
Esta é uma iniciativa que pretende corrigir as consequências dessa autêntica agressão ao poder local democrático, com prejuízo para as populações, que foi a liquidação em 2013 de mais de 25 por cento destas autarquias locais.
No âmbito da chamada reforma administrativa do poder local, esta medida do executivo anterior que levou à extinção de 1167 freguesias (o número passou de 4259 para 3092 freguesias), concretizada a partir da apresentação do denominado «Livro Verde», mereceu o vivo repúdio e contestação quer de eleitos quer das populações.
Testemunho expressivo dessa rejeição foi desde logo a gigantesca manifestação popular em Março de 2012 de oposição à intenção do governo PSD/CDS, que reuniu em Lisboa mais de 200 mil pessoas vindas de todo o País, bem como o silêncio a que se remeteram mais de dois terços das assembleias municipais existentes, não obstante as «fortíssimas pressões» a que foram sujeitas para que se envolvessem no processo.
E entre as múltiplas razões para essa condenação uma há que emerge como «transversal» e adquire uma particular acuidade, reclamando «pronta reparação». Trata-se do «desrespeito pelos princípios e formas de participação democrática profundamente entrosados na natureza própria do Poder Local», como se realça no preâmbulo do diploma comunista.
Efeitos negativos
PSD e CDS o que fizeram sob falsos argumentos foi avançar para a extinção de mais de um milhar de freguesias com base numa opção política e ideológica (também presente no pacto de agressão assinado com a troika) que tinha como principal objectivo subverter o poder local democrático e de que resultou o empobrecimento do nosso regime democrático.
Com efeito, diversamente do que foi propalado, foi praticamente nulo o impacto do ponto de vista financeiro, mas, ao invés, foi «muito significativo» o impacto que tal decisão teve no que toca à proximidade das autarquias e dos eleitos às populações.
Essas consequências profundamente negativas são visíveis e os deputados comunistas identificam-nas de modo claro no seu diploma, onde assinalam, por exemplo, o quanto (numa dimensão dificilmente mensurável) de proximidade entre as populações e seus representantes foi perdida a este nível de poder local com a redução de cerca de 20 mil eleitos de freguesia.
Mas também no grau de dificuldade acrescida entretanto criado à capacidade de intervenção na resolução dos problemas ou, noutro plano, na perda de identidade local. Ou ainda na redução da capacidade de reivindicação das populações, na medida em que enquanto seus representantes os eleitos das freguesias deram voz muitas vezes às reivindicações populares, fazendo-as chegar a outros níveis e instâncias de poder.
Como é dito no texto entregue esta segunda-feira na mesa da AR, «foi também esta voz "incómoda" e contrária às suas opções políticas que o governo PSD/CDS procurou aniquilar».
Maiores assimetrias
Já noutro plano, não é igualmente verdade, como propagaram PSD e CDS, que a extinção de freguesias tivesse correspondido a um reforço da coesão territorial. Ao invés, aumentou as assimetrias regionais já existentes, como os exemplos referidos nestas páginas bem demonstram.
Com efeito, ao fecho de inúmeros serviços públicos pelo País veio somar-se a extinção de freguesias, o que nalgumas localidades, em particular nas regiões rurais e do interior, significou maior isolamento e abandono das populações.
São todos estes aspectos negativos que o processo legislativo agora aberto pelo PCP pretende reverter, em nome do interesse das populações, das freguesias e dos municípios, da defesa do poder local democrático.
Liquidar e subverter
A extinção de freguesias não pode ser dissociada de um conjunto de outras medidas negativas inseridas numa ofensiva que tem como alvo o poder local democrático. Vem de longe o ataque a essa realidade constitutiva da organização democrática do Estado que são as autarquias, que adquiriram com o 25 de Abril um estatuto de verdadeira autonomia, com competências, meios financeiros e órgãos eleitos democraticamente.
Um edifício com consagração constitucional que é o resultado da luta e do envolvimento empenhado dos eleitos, das populações e suas estruturas representativas. E foi graças a essa dinâmica que foi possível erigir estes órgãos do poder local com autonomia administrativa e financeira, com um nível inigualável de proximidade às populações, ao movimento associativo e outras estruturas locais, bem como de satisfação de resposta aos problemas locais.
É exactamente por serem estas as suas características e este o seu papel que o poder local democrático emanado da Revolução do 25 de Abril tem sido alvo de uma prolongada ofensiva tendente à sua desfiguração, empobrecimento e mesmo destruição.
Ataques sucessivos com diversas formas mas com um intuito comum e muito preciso: asfixiar financeiramente o poder local, retirar-lhe autonomia procurando transformá-las em meras dependências da administração central, sangradas de meios humanos e financeiros e sob tutela do governo.
É a esta luz que deve ser vista a liquidação levada a cabo em 2013 pelo governo PSD/CDS.
Etapas do processo
Desde a primeira hora que o Grupo Parlamentar do PCP se opõe à estratégia de desmantelamento do Poder Local protagonizada pelo governo PSD/CDS. Rejeitada por si «totalmente», como recorda no preâmbulo do seu diploma, foi a perspectiva de reorganização territorial baseada em «critérios cegos» e que ignoraram por completo a «realidade concreta de cada território».
Pelo contrário, para o PCP, a reorganização administrativa do território deve ser «devidamente ponderada, atenta às necessidades das populações e às características de cada território e nunca contrária à opinião das populações e dos seus interesses».
É de acordo com estes princípios, e visando eliminar as «distorções induzidas pela "reorganização"» executada por PSD e CDS, que deve ser compreendido o diploma da bancada comunista.
Trata-se de um texto legislativo através do qual, desde logo, se pretende consolidar os resultados da «reorganização» que mereceram prévio consenso em ambos os órgãos deliberativos autárquicos chamados a pronunciar-se. É assim proposta no projecto de lei a «reposição automática e de princípio» de todas as freguesias extintas com oposição, expressa ou tácita, daqueles órgãos.
Trata-se, por outro lado, de abrir um «período de debate e decisão locais que, culminando em deliberações tomadas em sessões especiais dos órgãos», apure as experiências vividas e, em função disso, possa reformular a posição assumida inicialmente e propor «soluções diversas» ou a «pura e simples reposição das demais freguesias».
Reverter a efectiva extinção de freguesias em «todos os casos em que não tenha existido consenso nos órgãos deliberativos chamados a pronunciar-se e não haja oposição expressa pelos actuais órgãos» constitui um terceiro objectivo visado pelo diploma comunista.
Por último, propõe-se a reposição da vigência do regime jurídico de criação de freguesias.